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Todas as fotografias neste blog encontram-se algures em desporto.sapo.pt, salvo indicação em contrário
Por vezes diz-se que a tradição já não é o que era, mas os exemplos que provam o contrário não páram de aparecer. Tal como noutras épocas do passado, o Sporting de 2016/17 voltou a ser vítima do fatídico síndrome do Natal, esse pesadelo recorrente que tantas noites sem dormir custa aos adeptos leoninos. Na última jornada de Liga antes da data festiva – 18 de Dezembro – o Sporting perdia em casa com um Braga (0-1) orientado interinamente pelo ex-leão Abel Ferreira e caía para o quarto lugar, a oito pontos do topo, por troca precisamente com os minhotos. Por essa altura já a presença europeia tinha terminado, e o novo ano não significaria um recomeço, já que logo a 4 de Janeiro o Sporting era eliminado também da Taça da Liga, ao perder no Bonfim com o Setúbal (2-1), curiosamente também treinado por um homem com história em Alvalade, no caso José Couceiro. O golo decisivo dos sadinos apareceu numa grande penalidade sobre o final da compensação, o que motivou veementes protestos dos verdes-e-brancos. A 17 de Janeiro o Sporting despediu-se de mais um objectivo, ao ser afastado da Taça de Portugal pelo Chaves (1-0), que marcou aos 87 minutos por Carlos Ponck. O saldo das festas nesse dia era esclarecedor: restavam ao Sporting os 17 jogos da segunda volta do campeonato, com os mesmos oito pontos para recuperar face ao líder Benfica.
O cenário era diametralmente oposto ao do início da época, altura em que o optimismo era a nota dominante na casa do leão, muito por culpa da boa prestação global de 2015/16. Mesmo quando confrontado com um grupo difícil na Liga dos Campeões, o discurso da direcção do clube apontava a uma passagem aos oitavos-de-final. E enquanto na prova europeia a percepção ia mudando ao sabor das derrotas pela margem mínima frente a Real Madrid e Borussia Dortmund, na frente doméstica o Sporting não conseguiu capitalizar um arranque interessante, com cinco vitórias nas primeiras seis jornadas, que incluíram um clássico frente ao FC Porto (2-1), à terceira ronda. A derrota em Vila do Conde (3-1, 5.ª jornada) deu nas vistas, mas seriam os três empates consecutivos entre as rondas 7 e 9 que colocaram os leões em verdadeiros apuros. O primeiro a travar o Sporting nessa sequência seria o Guimarães, que recuperou de 0-3 para 3-3 no quarto-de-hora final do encontro, seguindo-se Tondela (1-1 em casa) e Nacional (0-0 fora).
O Natal aproximava-se então a passos largos, e o sinal mais claro disso apareceria a 7 de Dezembro, dia do fecho da fase de grupos da Liga dos Campeões. Um empate bastava para o Sporting assegurar o terceiro lugar do grupo e a passsagem para a Liga Europa, mas os leões saíram de Varsóvia derrotados pelo Legia (1-0), que assim se apurou com míseros quatro pontos, de resto os mesmos que teriam servido ao Sporting. O jogo seguinte, na jornada 13 da Liga, trouxe uma derrota (2-1) no dérbi da Luz, antecedendo a já referida derrota caseira com o Braga. Era então o princípio do fim para os leões. O desfecho ficou virtualmente confirmado pelos empates cedidos nas jornadas 17 (2-2 em Chaves) e 18 (2-2 no Marítimo), que elevaram a fasquia para os dez pontos de distância, e tiveram a saída da Taça de Portugal pelo meio. Pouco mais restava ao Sporting senão começar desde logo a pensar na próxima temporada, enquanto assistia à continuação uma luta particular.
FIGURA
Autor de 13 golos até à viragem do campeonato, Bas Dost não abrandou o ritmo até final da temporada, ao ponto de se ter imiscuído na luta pela Bota de Ouro com a fina flor do futebol europeu. Foi por pouco que o holandês perdeu o troféu para Lionel Messi, mas os seus 34 golos na Liga não só bateram os 32 do benfiquista Jonas em 2015/16, como foram o melhor registo desde os 42 de Jardel em 2001/02. Mais que isso: totalizaram metade dos golos marcados pelo Sporting neste campeonato! Dost terminou com três hat-tricks, frente a Boavista (28.ª jornada), Braga (31.ª) e Chaves (34.ª), mas o seu melhor momento aconteceu na jornada 25, na qual apontou os quatro golos do Sporting na visita a Tondela (1-4). Como nota de curiosidade, os últimos três póqueres na I Liga foram apontados por jogadores do Sporting: Liedson, frente ao Belenenses em 2009/10, e Carlos Bueno diante do Nacional em 2006/07). Bas Dost foi apenas o sexto jogador a assinar um póquer na I Liga desde a viragem do século.
NO OCASO
A performance de Bas Dost foi de tal forma luminosa que acabou por ofuscar o trabalho dos outros integrantes do Sporting de 2016/17, que ora foram tidos como flop, como Joel Campbell, ora passaram praticamente despercebidos, como aconteceu com Bryan Ruiz. Os golos do holandês tiveram também o condão de apagar quaisquer vestígios da passagem do seu antecessor, o argelino Islam Slimani, que ainda ficou o tempo suficiente para marcar no triunfo sobre o FC Porto na 3.ª jornada (28 de Agosto), antes de seguir para o Leicester City. Nessa partida o outro golo leonino foi apontado por Gelson Martins, que espalhou qualidade pelos flancos do ataque verde-e-branco.
Adrien Silva mais uma vez deu coração ao meio-campo, com o eterno Rui Patrício a adicionar coragem nas redes. Alan Ruiz despontou na segunda volta, a tempo de marcar seis golos na Liga, enquanto Coates se destacou no rector recuado.
TREINADOR
Com a equipa progressivamente fora da luta pelo título, faltaram a Jorge Jesus argumentos para alimentar a sua inesgotável fonte de declarações vistosas, pelo que se pode considerar que o técnico teve um ano atípico. Pelo menos em comparação com a última década. Ainda assim, em nenhum momento o seu lugar esteve perigosamente em causa, mesmo tendo chegado a ver lenços brancos.
CONTABILIDADE
Liga NOS: 3.º lugar, 21v-7e-6d, 68gm-36gs, 70 pontos; apurado para o play-off da Liga dos Campeões;
Taça de Portugal: derrotou Famalicão (0-1), Praiense (5-1) e Setúbal (0-1), antes de cair diante do Chaves (1-0) nos quartos-de-final;
Taça da Liga: eliminado no grupo A (6 pontos), atrás do Setúbal e à frente de Arouca e Varzim;
Liga dos Campeões: eliminado na fase de grupos, ao ser último do grupo F (3 pontos), atrás de Borussia Dortmund, Real Madrid e Legia Varsóvia.
O adejctivo “histórico”, tão banalizado hoje em dia, por uma vez aplica-se na perfeição. A corrida atrás da história que o Benfica vinha empreendendo nos últimos anos culmina agora no primeiro tetracampeonato encarnado, sendo quase inacreditável como um clube com tão ilustre palmarés só agora o tenha conseguido – o Sporting fê-lo em 1954, seguindo-se o FC Porto em 1998 e 2009. O Benfica foi, sem dúvida, a equipa mais regular desta edição da Liga NOS, liderando ininterruptamente desde a jornada 5 e sobrevivendo a um período menos bom por alturas da viragem do campeonato. A concorrência também contribuiu com o seu quinhão para o título das águias, nomeadamente no caso do FC Porto, que se ficou pelas ameaças quando parecia ter tudo para tomar o comando da classificação numa fase já adiantada da época, mas é impossível sugerir que o Benfica revalidou o título apenas graças ao demérito dos adversários directos.
Até porque o Benfica teve o mérito de saber adaptar-se aos diferentes momentos de forma por que a equipa passou, manejando da melhor maneira os ferros para arrancar o resultado que interessava quando não era possível praticar futebol de encher o olho. Determinante foi também a forma como os jogadores foram entrando e saindo das opções sem tornar o rendimento global da equipa assustadoramente baixo. Enquanto Jonas não regressou em força da lesão – o brasileiro marcou o primeiro dos seus 13 golos na Liga à 16.ª jornada –, as despesas ofensivas ficaram a cargo de Mitroglou e Jiménez, apoiados por Pizzi, que realizou a sua melhor época desde que está no Benfica. Enquanto nomes como Rafa – tanta tinta correu sobre ele no defeso – e Carrillo praticamente passaram ao lado, Gonçalo Guedes chamou tanto a atenção que saiu para o Paris Saint-Germain no mercado de inverno. Mais atrás no terreno, os centrais fizeram dos clássicos a sua coutada, com Lisandro López a marcar no Dragão e Lindelöf em Alvalade. Éderson voltou a dominar a baliza, e Nélson Semedo e Grimaldo – este mais na primeira volta – cotaram-se como outros nomes em destaque.
A época encarnada arrancou com a conquista da Supertaça Cândido de Oliveira (3-0 frente ao Braga), mas tal não se traduziu propriamente num tónico, pois o Benfica demorou a estabilizar. Logo à 2.ª jornada um empate caseiro com o Setúbal (1-1) foi o primeiro sinal de que havia trabalho a fazer. Esses até acabariam por ser os únicos pontos desperdiçados nas primeiras quatro jornadas da Liga, mas é curioso constatar que o Benfica defrontou exactamente as três equipas que terminariam o campeonato na cauda da classificação. Esses dois pontos perdidos foram suficientes para deixar os encarnados no terceiro posto, na véspera do arranque da Liga dos Campeões, onde o Benfica tomaria dois golpes duros ainda no mês de Setembro.
Com efeito, o Beşiktaş seria o primeiro a causar estragos, ao empatar na Luz (1-1) com um golo de Talisca – emprestado aos turcos precisamente pelo Benfica – no último suspiro do encontro. Duas semanas depois, em Nápoles, com uma hora de jogo o Benfica perdia por 4-0 e os pontos de interrogação eram mais que muitos. Gonçalo Guedes e Salvio ainda marcariam dois golos cosméticos, que não impediram que o Benfica voltasse a Portugal envolto em dúvidas. No campeonato, porém, as águias já tinham somado duas vitórias tidas como difíceis, frente a Braga (3-1) e Chaves (0-2), que funcionavam como sinais contrários às agruras vividas na prova continental. O mês de Outubro chegou já com o Benfica numa liderança que nunca cederia, o que vale por dizer que uma vez pesados os prós e os contras do primeiro mês e meio de temporada, a entourage benfiquista terá dado pouca importância aos desaires da Champions. Com maior ou menor dificuldade, o Benfica conseguiu as vitórias suficientes para resistir aos três tremores que ainda sofreria até final.
O primeiro desses tremores foi uma repetição do mau arranque na Liga dos Campeões. A 23 de Novembro, em Istambul, em meia hora o Benfica colocou-se a vencer por 0-3 e parecia ter o jogo na mão, mas o marcador final assinalaria 3-3, com dois dos golos do Beşiktaş a serem assinados por outros velhos conhecidos, no caso Quaresma e Aboubakar, ambos ex-FC Porto; a 6 de Dezembro, o Nápoles venceu na Luz (1-2), beneficiando de um Benfica na ressaca da derrota em casa do Marítimo (2-1) na sexta-feira anterior. Esse desaire na Madeira reduziu o avanço encarnado na tabela para apenas dois pontos. Os suores frios voltariam no novo ano. A 14 de Janeiro o Boavista demorou 25 minutos a colocar-se a vencer por 0-3 em pleno Estádio da Luz, antes de ver os homens da casa recuperar até ao empate final; a 25 foi o Moreirense a causar espanto ao afastar o Benfica da final da Taça da Liga com um valoroso triunfo por 3-1; por fim, a 30 de Janeiro, o Setúbal – o outro derrotado das meias-finais da Taça da Liga – voltou a fazer das suas e bateu os encarnados no Bonfim (1-0) pela primeira vez desde 1998/99.
Jogava-se a jornada 19 e o Benfica via-se com apenas um ponto de vantagem sobre o segundo classificado FC Porto. Foram necessários nervos de aço para sobreviver a essa fase, que coincidiu com o melhor período dos da Invicta. O Benfica respondeu a esse ímpeto do adversário com seis triunfos consecutivos – Nacional (c), Arouca (c), Braga (f), Chaves (c), Feirense (f) e Belenenses (c) –, numa sequência apenas manchada pela eliminação nos oitavos-de-final da Liga dos Campeões frente ao Borussia Dortmund. Tendo vencido em casa por um suado 1-0 – marcou Mitroglou (48’) e Éderson defendeu uma grande penalidade a Aubameyang (58’) – na Alemanha o Dortmund esteve ao seu melhor nível e reverteu a eliminatória (4-0), com Aubameyang desta vez a assinar um hat-trick. A série de vitórias na Liga conheceu um ponto final na jornada 26, a 18 de Março, com um empate em Paços de Ferreira (0-0). Seria aqui, em última instância, que o campeonato se decidiu. Enquanto o alarme soava estridente nas hostes encarnadas, o FC Porto não aproveitou para saltar para o comando, cedendo ele próprio um empate na recepção ao Setúbal. Na jornada seguinte os dois candidatos defrontaram-se na Luz e repetiram o resultado da primeira volta (1-1). Embora tenha ficado tudo na mesma, na prática o FC Porto desperdiçava duas oportunidades de escrever uma história diferente e ficava com esse ónus sobre os ombros. A velha máxima da candeia que vai à frente explica na perfeição a recta final do Benfica na Liga; cinco triunfos e um empate – em Alvalade (1-1) – garantiram o tetra a uma jornada do fim, num título carimbado com uma goleada (5-0) na recepção ao Guimarães. O empate final no Bessa (2-2) terá sido fruto de uma descompressão que quase custou ainda mais caro, já que o Benfica esteve a perder por 2-0.
TAÇA DE PORTUGAL
A época do Benfica encerrou com a conquista da sua 26.ª Taça de Portugal. Quatro anos depois da última final entre Benfica e Guimarães o resultado (2-1) repetiu-se, mas desta vez foi favorável às águias, que resistiram a uma boa primeira parte dos conquistadores, antes dos golos de Jiménez (48’) e Salvio (53’) darem alguma tranquilidade ao Benfica. O Vitória marcaria por Zungu (78’). O percurso encarnado até ao Jamor foi também ele feito de sobressaltos. Logo na terceira eliminatória o 1.º Dezembro, do Campeonato de Portugal, só caiu em definitivo (1-2) com um golo de Luisão aos 90’+6’ minutos. Foi por um triz. A fava desse susto foi paga pelo Marítimo, que saiu da Luz derrotado por 6-0. Nos oitavos-de-final o Benfica ultrapassou o Real (0-3), que viria a sagrar-se vencedor do Campeonato de Portugal, em encontro disputado no Restelo, antes de nova goleada (6-2), agora sobre o Leixões, nos quartos-de-final. Na meia-final o Estoril vendeu cara a derrota, principalmente na segunda mão, na qual por três vezes se colocou a um golo de distância de eliminar o Benfica. O 3-3 final foi suficiente para os encarnados, que tinham vencido na Amoreira por 1-2.
TREINADOR
Mais uma vez, Rui Vitória mostrou que não cede facilmente à pressão. Assim que se acomodou à dimensão da cadeira que ocupa, Vitória rebateu bem as constantes invectivas do seu homólogo do Sporting ao longo da época passada, e tanto nesse ano como neste, defendeu o grupo de trabalho sem precisar de fazer grandes declarações e, mais importante, sem entrar em pânico quando a pressão classificativa imposta pelos rivais mais apertou, ou quando apareceram restulados menos positivos.
FIGURAS
Éderson assumiu-se como um guarda-redes em nome próprio. Em nenhum momento da temporada o lugar do brasileiro foi questionado.
Durante a primeira metade da temporada Gonçalo Guedes e Grimaldo estiveram em foco; no retrato global saltam à vista o central Lindelöf, os médios Pizzi e Salvio, e os avançados Mitroglou e Jonas, que juntos marcaram 29 golos só no campeonato.
O avançado mexicano Jiménez foi ele próprio decisivo em alguns jogos mais apertados.
CONTABILIDADE
Liga NOS: 1.º lugar, 25v-7e-2d, 72gm-18gs, 82 pontos; apurado para a fase de grupos da Liga dos Campeões;
Taça de Portugal: vencedor;
Taça da Liga: venceu o grupo C (9 pontos), à frente de Guimarães, Paços de Ferreira e Vizela; eliminado na meia-final pelo Moreirense (3-1);
Supertaça Cândido de Oliveira: vencedor, ao bater o Braga (3-0);
Liga dos Campeões: segundo classificado no grupo B (8 pontos), atrás do Nápoles e à frente de Beşiktaş e Dinamo Kiev; eliminado nos oitavos-de-final pelo Borussia Dortmund (1-0c, 0-4f).
Estas palavras já foram escritas na crónica do recente jogo com o Paços de Ferreira, mas é difícil não voltar a elas: o FC Porto vive uma fase de insucesso continuado que não estaria na mente dos seus aficionados se lhes tivesse sido perguntado há uns seis, sete anos. E para provar que a persistência da falta de títulos traz inevitavelmente consigo ansiedade, impaciência e decisões precipitadas, basta constatar que há dois anos Julen Lopetegui – independentemente do que foi pensado, sentido, dito e escrito na altura – resistiu a uma época de “quase”, e agora Nuno Espírito Santo não. Talvez esta comparação não seja justa, não só porque Nuno não foi tão contestado e acusado como Lopetegui, mas também porque fez o plantel sentir a camisola de uma forma que o espanhol nunca conseguiu, mas faltou, no entanto, o “quase”. Esse “quase” que transforma as estatísticas positivas numa mão cheia de nada. Senão vejamos: o FC Porto foi a equipa que esteve mais tempo sem perder na Liga NOS (30 jogos, entre as jornadas 4 e 33), teve a mais longa sequência de vitórias da época (9 jogos, entre as rondas 17 e 25) e foi durante largas jornadas a melhor defesa e o melhor ataque, sendo só ultrapassado no último dia, mas nada disso serviu para contrabalançar o peso dos dez empates averbados. Só em 2004/05 (11) e em 1988/89 (14, num campeonato com 20 equipas) os dragões empataram mais.
Nuno Espírito Santo teve então o mérito de ter conseguido reunir as tropas em torno do objectivo maior. Não só os jogadores, como também os próprios adeptos, que apoiaram a equipa mesmo quando tudo já estava perdido. Os assobios foram pouco mais que esporádicos, em função de uma ou outra exibição menos condizente. Pode até dizer-se que todo o capital de confiança de que técnico e equipa dispuseram resultou de um jogo apenas, no caso a ida ao Olímpico de Roma na segunda mão do play-off de acesso à Liga dos Campeões. Depois de um nervoso empate a um golo no Dragão, o FC Porto regressou da capital italiana com uma vitória por 0-3. É certo que os azuis-e-brancos beneficiaram de a Roma ter tido homens expulsos em ambos os jogos, mas como o que fica é o resultado, a vitória portista serviu ainda para deixar a concorrência em sentido. A confiança trazida de Itália, porém, demorou algum tempo a consolidar-se, pois logo a seguir o FC Porto perdeu em Alvalade (2-1) e mais à frente cederia empates frente a FC Copenhaga (1-1 em casa) e Tondela (0-0 fora). Estávamos em meados de Setembro, e esse primeiro mês da temporada deixava o FC Porto um tanto ou quanto em xeque. Já havia pontos para recuperar na classificação e a equipa alternava boas exibições com outras em que se deixava tomar pela ansiedade, como no referido jogo de Tondela.
Ao longo da primeira volta, de resto, enquanto a versão casa do FC Porto era implacável, a versão fora era pouco mais que inconsequente. A ansiedade portista atingiu um pico no mês de Novembro, cujo negrume futebolístico ameaça tornar-se tradição. Nos sete jogos realizados entre 29 de Outubro e 29 de Novembro o FC Porto não só empatou seis, como também somou o estonteante total de 2-1 em golos. Encontrando-se três pontos abaixo do líder antes dessa jornada 9, os dragões começaram por empatar em Setúbal (0-0), antes de bater o Club Brugge (1-0) na Liga dos
Campeões com uma exibição bem cinzenta. Seguiu-se o doloroso empate caseiro com o Benfica (1-1, 6 de Novembro), no qual o FC Porto terá realizado a sua melhor exibição em toda a temporada, mas sucumbiu a um golo aos 90’+2’, após ter concedido um canto absolutamente desnecessário. O choque foi tal que o FC Porto não encontrou forma de marcar um golo que fosse ao Chaves em 120 minutos, dizendo adeus à Taça de Portugal num desempate por grandes penalidades (3-2) em que Layún, Depoitre e André Silva falharam (18 de Novembro). De seguida, o empate em Copenhaga deixou o futuro na Liga dos Campeões por resolver. Faltava um duplo confronto com o Belenenses, que resultou em mais 180 minutos sem golos, que se traduziram numa distância de sete pontos em relação ao comando da Liga NOS e num hipotecar de perspectivas na Taça da Liga.
A pressão era enorme nesta fase. O adversário seguinte era um Braga que estava só dois pontos atrás dos dragões e que tinha acabado de golear o Feirense por 6-2. Os minhotos ficaram reduzidos a dez homens ao minuto 35 em função de uma grande penalidade cometida, mas viram André Silva falhar a conversão. O FC Porto esfalfou-se ao máximo, mas só seria premiado aos 90’+5’ minutos, quando o improvável Rui Pedro finalmente quebrou o enguiço (1-0). As nuvens negras ficaram mesmo para trás, e os portistas prosseguiriam batendo um Leicester City experimental por 5-0 para garantir a passagem na Liga dos Campeões, e o Feirense por 0-4 numa partida em que jogaram 87 minutos com mais um jogador. A equipa voltou a entrar nos eixos mas ainda faltava passar por novos dissabores, por alturas da passagem de ano. A 29 de Dezembro o Feirense foi ao Dragão arrancar um empate a um golo na Taça da Liga; a 3 de Janeiro o Moreirense atirou mesmo o FC Porto para fora da prova ao vencer por 1-0 no Minho; e a 7 de Janeiro um empate em Paços de Ferreira (0-0) colocava os azuis-e-brancos a seis pontos da liderança do campeonato. O cenário nesse dia era, de facto, terrível para o FC Porto. Os oitavos-de-final da Liga dos Campeões eram a única distracção que os dragões teriam até final do campeonato. Por muito inaceitável que tal fosse, era essa a verdade nua e crua.
E foi aí que o FC Porto recuperou alguma da chama que o guiou tantas vezes no passado, arrancando para a tal série de nove vitórias de enfiada, que duraria até meados de Março. Nessa fase os dragões venceram Moreirense (c), Rio Ave (c), Estoril (f), Sporting (c), Guimarães (f), Tondela (c), Boavista (f), Nacional (c) e Arouca (f), com 29-4 em golos. Pelo meio encaixaram-se os jogos europeus com a Juventus, nos quais o FC Porto não fez má figura, apesar do agregado de 0-3, mas provou do mesmo veneno que a Roma tinha provado no play-off, ao ser vítima do cartão vermelho em ambos os jogos. Os nove triunfos consecutivos do FC Porto na Liga NOS coincidiram com o período menos fulgurante do líder Benfica, permitindo que os dragões se aproximassem até à distância mínima de um ponto.
Foi aí que a pressão e a ansiedade voltaram a atacar. As jornadas 26 e 27 foram cruciais para o desfecho da Liga. Duas vitórias teriam colocado o FC Porto na liderança com quatro pontos de avanço, mas a equipa não aproveitou o deslize do Benfica nessa ronda 26, empatando também. Uma semana depois, na Luz, novo empate deixou tudo na mesma. A equipa não voltou a encontrar-se e cederia mais três empates até final, frente a Braga (1-1 fora, jornada 29), Feirense (0-0 em casa, jornada 30) e Marítimo (1-1 fora, jornada 32), contra apenas dois empates do líder. A jornada 33 assinalou o fim da ténue esperança portista. O campeonato encerraria com uma bofetada, na forma de uma derrota por 3-1 em Moreira de Cónegos. Sem ter ligado o chip competitivo para esse encontro, o FC Porto via assim cair a tal sequência de 30 partidas sem derrotas.
Ficava a faltar uma última notícia. No dia seguinte ao fecho da época, Nuno Espírito Santo chegava a acordo para a rescisão do contrato que o ligava ao FC Porto por mais um ano. Voltando à ideia veiculada no início deste texto, só a pressão de quatro anos arredado do título permite entender a saída do treinador. Talvez seja mais fácil entendê-la do que aceitá-la. Certo é que em 2017/18 o FC Porto iniciará o terceiro projecto novo em cinco temporadas. Só uma ideia ocorre ao vosso humilde escriba neste momento: o FC Porto vive um período de sportinguização.
TREINADOR
Nuno Espírito Santo parecia ser o homem certo no lugar certo na altura em que foi apresentado. Afinal de contas, o que será melhor que um homem com história na casa para transmitir ao plantel o que significa envergar a camisola do FC Porto? A história recente do FC Porto diz que nem sempre o currículo do novo treinador importa, sendo vários os exemplos de técnicos que chegaram ao clube com pouco mais que o canudo. Nuno trazia então na bagagem as presenças do Rio Ave nas finais das duas taças nacionais em 2013/14 e um apuramento para a Liga dos Campeões com o Valência na época seguinte. Experiência mais que suficiente para assumir o cadeirão técnico do FC Porto. Dispondo de um plantel bastante jovem, nomeadamente nos sectores mais avançados, Nuno conseguiu criar as bases para que a equipa praticasse um futebol apelativo, mas não foi capaz de limpar a ansiedade da cabeça dos jogadores nos momentos em que a pressão mais subiu de intensidade. Frequentemente criticado por ser brando na forma como comunicava com a imprensa e na reacção a eventuais prejuízos ao FC Porto, Nuno nunca foi acusado das mesmas coisas que Julen Lopetegui foi no seu tempo. Com efeito, tal como o agora seleccionador espanhol, Nuno não criou um onze-base – exceptuando a composição da defesa – e além disso insistiu em experimentações na disposição dos jogadores e nos esquemas tácticos utilizados, que flutuaram entre o 4x3x3 e variantes do 4x4x2. A equipa construía rotinas, mas logo elas eram alteradas, não havendo assim a possiblidade de as consolidar. As saídas prematuras das duas taças foram outro ponto negativo para a causa do técnico, assim como a leitura que fazia dos jogos, a qual nem sempre conduziu às melhores substituições. Ainda assim, considerando o sentido de compromisso que Nuno Espírito Santo conseguiu instigar na equipa, talvez a saída fosse a última coisa que o treinador merecia no final da temporada. Até porque as soluções não abundavam no plantel, ainda que o mesmo não fosse tão deficitário como em alguns dos anos mais recentes e não tenha sido afectado por demasiadas lesões e castigos.
EQUIPA
Guarda-redes
Casillas realizou uma temporada muito acima do seu ano de estreia em Portugal. Comandou a área como os grandes nomes das balizas portistas do passado o faziam, e ainda teve oportunidade de ser decisivo em alguns momentos, mais notoriamente nos encontros com Sporting (c) e Benfica (f). Naturalmente que ter à sua frente uma defesa sólida ajudou a melhorar o seu próprio rendimento, mas é inegável que Casillas voltou a ser ele próprio. Só sobraram migalhas para José Sá, que assumiu a baliza nas partidas das duas taças e na última jornada do campeonato, sempre sem comprometer.
Defesa
Foi o sector mais estável da equipa. Maxi Pereira, Marcano, Felipe e Alex Telles deram bem conta do recado (19 golos sofridos no campeonato contra 30 sofridos em 2015/16). A sua solidez foi essencial, até porque as soluções eram então poucas. Boly foi terceira opção no centro e somou poucos minutos, enquanto nas laterais Layún perdeu espaço, terminando a época praticamente como um proscrito, ao ponto de na 32.ª jornada ter sido Fernando Fonseca, da equipa B, a colmatar o castigo de Maxi Pereira.
Meio-campo
As constantes mudanças operadas pelo treinador não permitiram tirar o melhor rendimento de André André, Óliver Torres e Otávio, enquanto Rúben Neves e João Carlos Teixeira não passaram de alternativas e Herrera voltou à inconstância que tantas vezes o caracteriza. O destaque absoluto do miolo portista foi o trinco Danilo Pereira, peça essencial na ligação entre sectores, fazendo ainda uma perninha na defesa quando foi necessário. Evandro, que também não passou de alternativa, saiu em Janeiro para o Hull City. Sérgio Oliveira não existiu.
Ataque
André Silva foi o homem em foco ao longo da primeira metade da temporada, correspondendo à esperança que nele era depositada desde o final da época transacta. Nas extremas, Brahimi começou também ele na condição de proscrito, mas terminaria como indispensável, apesar do excesso de individualismo que não foi capaz de corrigir; já Corona, apesar de mostrar bons pormenores, ainda não conseguiu ser mais regular. Diogo Jota foi um abre-latas, nomeadamente durante a primeira metade da
época, coleccionando bons golos e conduzindo contra-ataques com classe, mas as mudanças tácticas, aliadas à chegada de Soares em Janeiro retiraram-lhe espaço. O ponta-de-lança brasileiro pegou de estaca, apontando nove golos nos seus primeiros seis jogos. A sua utilização em conjunto com André Silva potenciava ambos, mas nem sempre foi essa a opção do treinador. Já Depoitre, que começou como segunda opção para a cabeça do ataque, caiu um nível na hierarquia com o aparecimento súbito de Rui Pedro, e mais desceu quando Soares chegou e tomou o lugar de assalto. Nota ainda para Adrián López, que foi utilizado em nove partidas mas sairia em Janeiro para o Villarreal, e para Varela, que calçou as chuteiras em sete encontros antes de rumar ao Kayserispor.
Menção honrosa
Kelvin jogou 21 minutos no encontro da 17.ª jornada frente ao Moreirense, a 15 de Janeiro, e pouco depois era emprestado ao Vasco da Gama. O do Rio de Janeiro, não o de Sines.
MARCADORES
Liga NOS
16 golos – André Silva (cinco de grande penalidade);
12 – Soares (mais sete pelo Guimarães);
8 – Diogo Jota;
6 – Brahimi (2 g.p.)
4 – Marcano e Danilo Pereira;
3 – Corona;
2 – Felipe, Rui Pedro, Óliver Torres, Otávio, Herrera e Maxi Pereira;
1 – Alex Telles, Depoitre, Rúben Neves, Layún e André André;
Auto-golo – João Aurélio, do Guimarães.
Taça de Portugal
1 – Otávio, Corona e Depoitre.
Taça da Liga
1 – Marcano.
Liga dos Campeões
4 – André Silva (2 g.p.);
1 – Otávio, Layún, Corona, Brahimi e Diogo Jota.
CONTABILIDADE
Liga NOS: 2.º lugar, 22v-10e-2d, 71gm-19gs, 76 pontos; apurado para a fase de grupos da Liga dos Campeões;
Taça de Portugal: venceu o Gafanha (0-3) na 3.ª eliminatória; perdeu com o Chaves (0-0 a.p., 3-2 g.p.) na eliminatória seguinte;
Taça da Liga: último classificado no grupo B (2 pontos), atrás de Moreirense, Belenenses e Feirense;
Liga dos Campeões: ultrapassou a Roma no play-off (1-1c, 3-0f); segundo classificado no grupo G (11 pontos), atrás do Leicester City e à frente de FC Copenhaga e Club Brugge; eliminado nos oitavos-de-final pela Juventus (0-1c, 0-2f).
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