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Todas as fotografias neste blog encontram-se algures em desporto.sapo.pt, salvo indicação em contrário
Não assisti ao jogo.
Cerca de três meses depois, o futebol de I Liga retomou a actividade. Fora das quatro linhas está tudo bastante diferente. As precauções sanitárias são mais que muitas e as bancadas, em vez da chamada moldura humana, estão emolduradas por lonas alusivas ao clube da casa. Dentro das quatro linhas, porém, é como se nada tivesse mudado. Sem mostrar futebol variado, o FC Porto dominou o primeiro tempo e construiu uma ou outra oportunidade, mas não teve engenho suficiente para converter em golo. Umas vezes por demérito, outras porque o guardião famalicense Defendi fez jus ao nome; nomeadamente ao minuto 35, quando foi buscar, com a perna, uma finalização de Soares colocadíssima ao cantinho inferior do poste direito. Nada mudou, escrevíamos, porque assim que o Famalicão marcou (48'), foi como se o FC Porto ligasse o mais estridente alarme e com isso não conseguisse a concentração necessária para responder em condições à desvantagem. Ainda para mais, os dragões sofreram um golo evitável. Pressionado por Diogo Gonçalves, Manafá atrasou para Marchesín, que devia ter imediatamente batido a bola para longe, pois o famalicense continuou na pressão. Ao invés, o argentino quis lembrar os tempos de Helton, ao fintar e jogar para o lado contrário. Fábio Martins farejou o erro, intrometeu-se, e só teve que empurrar. Paradoxalmente, o golo mudou tudo no jogo. Se o Famalicão esteve confortável numa postura mais retraída, melhor ficou; o FC Porto, como acima se alude, passou a ter mais sofreguidão, mas, à conta desse futebol pouco variado, de pouco lhe servia. Seria Corona - tamanha ironia nos tempos que correm - a acender uma luz de esperança à passagem do minuto 74, com um remate cruzado desde a direita. Foi sol de pouca dura, pois logo a seguir (78') Pedro Gonçalves, com um remate colocado de fora da área, voltou a bater Marchesín, perante o demasiado espaço dado pela defensiva azul-e-branca. Sérgio Conceição já tinha inclinado a equipa para a frente trocando Danilo Pereira por Zé Luís (72') - talvez o segundo golo tenha sido o preço pago pela retirada do internacional português -, e ainda refrescou o ataque com Aboubakar no lugar de Soares, mas foi uma noite em que os avançados portistas - mais Marega - primaram pela inconsequência. Até final, nota para um lance em que Aboubakar ficou a reclamar grande penalidade, não se sabe bem se por eventual derrube, ou eventual mão de Nehuén Pérez. Como sempre, ninguém garante que o eventual penálti seria convertido. O empate seria mais justo, mas só contam as que entram, também como sempre. E assim, as dúvidas - da mais diversa ordem - que havia sobre o recomeço do campeonato estendem-se ao relvado. Quão surreais serão estas jornadas?
À oitava jornada o Estádio do Dragão recebia o jogo do líder invicto do campeonato, que em caso de derrota perderia a liderança precisamente para a outra equipa. E se houvesse empate poderiam até ser terceiros a assumir o comando. As condicionantes e implicações deste encontro assemelham-se às dos clássicos, mas a verdade é que estas linhas não se referem sequer ao FC Porto, porque o mundo da I Liga tem estado ao contrário e o líder invicto era mesmo o Famalicão. Motivados pelo surpreendente arranque, os minhotos apresentaram-se abertos, à procura de jogar o mais próximo possível dos olhos do FC Porto e dispostos a pagar o preço dessa atitude. Havendo mais espaços junto à sua baliza, o Famalicão permitia diversos lances prometedores aos dragões, que perceberam bem a exigência do jogo. O Famalicão apareceu menos vezes com perigo frente a Marchesín, e foi por um triz que não levou o nulo para o descanso. Ao sair a jogar, Patrick William entregou a bola a Otávio, que lançou Luiz Díaz para uma boa tabelinha com Corona antes da finalização do colombiano (45'). A toada manteve-se na segunda parte. Até ao momento em que o Famalicão mete o pé pela segunda vez na mesma argola (73'). Desta vez foi Lionn a colocar em Soares, que avançou, ficou sem ideias, teve sorte no ressalto e acabou por disfarçar fintando com classe o guarda-redes. Como não há duas sem três, outra perda de bola desnecessária culminou em novo golo portista (88'). Agora foi o próprio guarda-redes Defendi a sucumbir à pressão de dois contrários, permitindo a Fábio Silva apontar o seu primeiro golo na Liga. No final, a liderança mudou de mãos e o Famalicão sai como um digno vencido, embora o 2-0 talvez fosse mais ajustado. A luta, como sempre, continua até à 34.ª jornada.
Não se podiam mesmo pedir dias mais agitados no reino do dragão. Depois de três jogos sob a batuta de Rui Barros, o FC Porto foi a jogo ainda com o antigo médio nos comandos, mas já com o novo treinador na bancada. O escolhido, ao cabo de quase duas semanas de indefinição, é José Peseiro, que se desvinculou dos egípcios do Al-Ahly para rumar à Invicta. Infelizmente para o técnico, o que a equipa lhe mostrou decerto não terá deixado as melhores impressões.
A falta de empenho dos dragões na Taça da Liga já tem barbas, mas mesmo pesando esse factor, este terá sido o pior jogo de sempre do FC Porto nesta competição. Possivelmente por não querer sobrecarregar os principais nomes da equipa na véspera da entrada de Peseiro em funções, Rui Barros montou um onze altamente experimental, lançando mão a nomes como Víctor García, Lichnovsky, Sérgio Oliveira e André Silva, hoje como extremo. O encontro marcou também a estreia de Hyun-Jun Suk pelo FC Porto.
A perspectiva por que se poderia ver o jogo cai por terra a partir do momento em que o Famalicão também entra com um onze alternativo e certos jogadores do FC Porto simplesmente não se conseguiram superiorizar. José Ángel não acertou um passe e Varela terá feito uma das piores exibições da sua carreira. Imbula quase não existiu em campo. É necessário ainda perguntar a alguém se este Maicon é o mesmo que há uns anos jogava no FC Porto. Até Helton esteve desconcentrado, sendo muito mal batido no golo de Mauro Alonso (58’), que decidiu a partida. O livre cobrado pelo brasileiro do Famalicão bateu no chão mesmo à frente do veterano guarda-redes, deixando-o muito mal na fotografia. No decorrer do segundo tempo Corona foi lançado na tentativa de mexer com o jogo, o que não viria a acontecer. Francisco Ramos e Ismael Díaz, da equipa B, ainda tiveram oportunidade de jogar uns minutos.
No final, não é possível recordar mais que um cabeceamento de Suk à trave, aos 85 minutos. Foi um suplício assistir ao jogo. Pareceu mesmo um jogo de amigos marcado no próprio dia por mensagem, em que só alguns se conhecem entre si. Pior que isso, só pensar que o FC Porto fica matematicamente eliminado da Taça da Liga, ainda com um jogo por disputar, e está no último lugar de um grupo que inclui duas equipas da II Liga.
Na zona de entrevistas rápidas, questionado sobre o ânimo do plantel neste momento, Helton disse “precisamos de nos ajudar, mas também precisamos de ajuda”. Palavras tão sinceras quanto esclarecedoras sobre o estado de alma actual do FC Porto. Espera-se que o início da primeira sessão de treino de José Peseiro no Olival seja o regresso de alguma normalidade ao dia-a-dia portista. Até quando resistirá o fôlego da entrada do novo treinador?
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